Eu era um vendedor de consórcios iniciante. Tímido como sempre, fui sem nenhuma experiência e acabei aceitando o emprego justamente por não precisar comprovar a mesma. Para a administradora de consórcios era indiferente: Se eu tivesse talento e vendesse ótimo. Se não levasse jeito para a coisa era só me demitir, mesmo por quê nem registro em carteira eu tinha.
Como tinha sido office-boy em dois empregos anteriores (experiência indispensável em minha formação, pois fui obrigado a 'ficar esperto' em vários sentidos), conhecia inúmeras regiões da capital paulistana e também das cidades circunvizinhas, a tal de Grande São Paulo.
Andava muito, literalmente. Não tinha carro ou moto e, muitas vezes, tinha que optar em utilizar o pouco dinheiro disponível para comer algo na rua ou pagar minha condução. E assim aconteceu no relato abaixo.
Um certo dia estava fazendo a região da Vila Maria, próximo à Av. Gulherme Cotching, e durante boa parte do dia ainda não tinha vendido nada. Exausto e com fome, estava além do horário de almoço. Chequei minha carteira e vi que o dinheiro que tinha era suficiente apenas para pagar meu ônibus da Vila Maria até o Belenzinho, e de lá pegar o Metrô até a Vila Mariana, onde ficava o escritório da adminstradora de consórcios que trabalhava. De lá, pegaria mais um ônibus até minha casa, onde , enfim, faria a única refeição decente do dia.
Naquela época já tinha perdido uns 10 quilos, exatamente por esta equação maldita do "ou volto pra casa ou como alguma coisa". Como estava exausto e quase desmaiando de fome, avaliei rapidamente a situação e decidi enfrentar à pé alguns kilômetros à pé para poder 'comer' alguma coisa, senão ia desmaiar pelo caminho.
(Importante salientar que ainda não era cristão. No máximo um misto de ex-católico / espírita / 'porra louca', não mais que isso.)
À frente de mim uma lanchonete cheia de gente almoçando. Eu estava lá, vestido de calça social, camisa, gravata, cinto e sapatos vagabundos, comprados em alguma liquidação qualquer. Uma pasta com contratos em branco na mão e, em meu nariz, um delicioso cheiro de "bife-ovo" vindo do prato dos outros. Para gastar, apenas o dinheiro de uma passagem de ônibus...
Aproximei-me do balcão, chamei um atendende e perguntei quanto estava a vitamina. Ele me disse o valor, que se encaixava no que 'podia' gastar. Pedi um copo. Sentei-me na cadeira do balcão e vi o rapaz colocar duas bananas, metade de um abacate, uma generosa fatia de mamão, meio litro de leite e açúcar. Aquilo me chamou a atenção. Deveria estar fazendo vitamina para mais de um cliente. Após bater a vitamina, ele encheu um grande copo e colocou em minha frente todo o resto da vitamina que estava no liquidificador.
Em seus olhos pude ver que ele não era um ser humano 'normal'. Me olhava com discrição, mas ao mesmo tempo via em seus olhos um amor incondicional. Hoje para mim é fácil compreender, mas na época apenas achei que ele viu o estado que estava e ficou com pena do adolescente de 19/20 anos, faminto e cansado.
Devorei a vitamina em poucos minutos. Paguei, agradeci o balconista e saí para tentar bater em mais algumas portas, revigorado com a 'refeição'. Não tendo obtido sucesso, 'encerrei meu expediente' e fui a pé até o Metro Belém. Andei pra caramba...
Quando olho para trás lembro-me deste episódio com carinho e emoção (estou com lágrimas nos olhos ao escrever sobre isso). O quê move o coração de uma pessoa que não te conhece a fazer o bem para ti, incondicionalmente? Eu não era uma 'gostosa' qualquer, que ele poderia ter ficado interessado. Pelo contrário! Estava mais para Isaias 53:3: "Era desprezado, e o mais rejeitado entre os homens, homem de dores, e experimentado nos trabalhos; e, como um de quem os homens escondiam o rosto, era desprezado, e não fizemos dele caso algum" do que qualquer outra coisa! E creio firmemente que foi isso o que ele viu.
Onde quero chegar com este relato? Quero por acaso que fiquem com pena de mim? De maneira nenhuma! Quero chamar a sua atenção para algo que tem me intrigado ultimamente! Veja o que o Senhor disse:
"E quando o Filho do homem vier em sua glória, e todos os santos anjos com ele, então se assentará no trono da sua glória; E todas as nações serão reunidas diante dele, e apartará uns dos outros, como o pastor aparta dos bodes as ovelhas; E porá as ovelhas à sua direita, mas os bodes à esquerda. Então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde, benditos de meu Pai, possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo. Porque tive fome, e destes-me de comer; tive sede, e destes-me de beber; era estrangeiro, e hospedastes-me; Estava nu, e vestistes-me; adoeci, e visitastes-me; estive na prisão, e fostes ver-me.
Então os justos lhe responderão, dizendo: Senhor, quando te vimos com fome, e te demos de comer? ou com sede, e te demos de beber? E quando te vimos estrangeiro, e te hospedamos? ou nu, e te vestimos? E quando te vimos enfermo, ou na prisão, e fomos ver-te? E, respondendo o Rei, lhes dirá: Em verdade vos digo que quando o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes". - Mateus 25:31-41
Já se viu na posição de "pequenino"? Por outro lado, já fizeste isso por alguém? Já criticou o assistencialismo de inúmeras religiões não cristãs que agem desta maneira?
E agora? O que dizer de nossa religião vazia, cheia de palavras e pobre em atitudes práticas?
Este rapaz que me deu de comer por acaso vai pro inferno? Já fui um pequenino...
Tenho apenas mais uma citação da Palavra de Deus, após isso termino:
"E já está próximo o fim de todas as coisas; portanto sede sóbrios e vigiai em oração. Mas, sobretudo, tende ardente amor uns para com os outros; porque o amor cobrirá a multidão de pecados". - 1 Pedro 4:6-7
E agora, o que dizer????
sexta-feira, 6 de agosto de 2010
Já sentiu fome?
5 comentários:
Anônimo, eu não sei quem é você, mas o Senhor te conhece muito bem. Sendo assim, pense duas vezes antes de utilizar este espaço LIVRE (poderia bloquear comentários de anônimos mas não o faço por convicção pessoal e direção espiritual) antes de ofender quem quer que seja. Estou aberto para discutimos idéias sem agredir NINGUÉM ok? - Na dúvida, leia mil vezes Romanos 14, até ficar encharcado com a Verdade sobre este assunto...
Nada a dizer, quem sabe a lamentar que tenho feito tão diferente do que o mestre faria.
ResponderExcluirabs
Dispensa comentários...
ResponderExcluirMas já que você falou no assistencialismo religioso é justamente isso que eu estranho pra caramba e que eu chamo de evangelismo de agenda, posto que mecânico e com espaço físico definido onde a "compaixão" é derramada. E só lá.
Isso é muito esquisito e euzinha nunca vou entender...
Ei, cadê o texto do Veríssimo? aff
abs
R.
Depois coloco por aqui... rrs
ResponderExcluirA paz de Deus a todos
ResponderExcluirCaro JC, lendo o seu texto, me ví no seu lugar....qto sofrimento, qtas humilhações...
Vc deve ser 1 cara manteiga derretida, emotivo e de vez em qdo explosivo, e depois se arrepende do que fez, não é? sou assim tbém....
Mas 1 coisa te falo, da minha boca não sai palavras torpes, pq temos q dar conta de todas as palavras ociosas, imagine as torpes?
Qto ao texto abaixo, realmente, o assistencialismo é mecânico, na CCB onde congrego e vcs conhecem muito bem, não é diferente, todos os meses são mesmo atendidos....
Mas como vc disse, a questão é nós..boa reflexão, bom breque.....temos q reavaliar os nossos conceitos e atitudes...
É anonimo, sou assim mesmo.. rsrs
ResponderExcluirobrigado pela visita!